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MINHA TRAJETÓRIA

      Júlio César Pinto de Oliveira é artista visual, performance, escultor, poeta e ator. Assim como poucos outros Júlios Césares de nome, esse Júlio César que aqui apresentaremos é, portanto, grande em vida. Nascido em Teresina, estado do Piauí, no dia 09 de agosto de 1965, é filho de pai artista e de mãe guerreira, ambos nordestinos. Criança prodígio, como se diria hoje, Júlio César, ainda criança, já apresentava uma propensão ao fazer artístico, sem dúvida alguma talento passado de pai para filho. O artista-pai muito estimulou o precoce talento do artista-filho, presenteando-lhe com um kit de lápis de colorir e um caderno profissional de desenhos, que durante muito tempo foram os melhores amigos do iniciante pintor.
   A professora do primário, que já havia percebido no pequeno César uma auréola singular, especial, ficava surpreendida com a qualidade dos desenhos desenvolvidos por aquele garoto de seis anos. Nessa época as notas altas vinham com facilidade, assim como os prêmios viriam com a mesma facilidade em um futuro não muito distante, embora ainda desconhecido pelo artista.
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    Viveu um curto espaço de tempo no Piauí, às margens do grande rio Poti, mas logo teve de se mudar com a família para o estado do Pará, vivendo a partir daí às margens do majestoso rio Xingu, até os dezenove anos de idade. Do Pará herdou muita coisa: a efervescência artística do Estado teve sobre o artista, então em processo de amadurecimento artístico, um enorme peso, contribuindo para sua formação social e estética. Mas logo mais Júlio César faria aquela que seria sua viagem “definitiva”, residindo às margens do rio que lhe batizaria com um nome artístico todo especial: Botôto.
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     Foi em Porto Velho, capital de Rondônia, que Júlio César aportou em 2008, já adulto e sozinho. Foi às margens do temido rio Madeira que o artista se encontrou um dia: era no período do verão e as águas do rio estavam esverdeadas. O céu de anil e o banzeirar das águas encontraram o artista, triste e melancólico, a pensar sua existência. Nesse processo de meditação interior, Júlio César travou um diálogo com o rio, confidenciando-lhe suas angústias. Foi aí que, de repente, viu o artista um grande tufo de água se erguer por sobre sua cabeça. Assustado, pensando estar sendo atacado por animal selvagem, Júlio César logo recobrou a tranquilidade ao perceber que esse convite de amizade partira de um boto tucuxi.
      Alegre e encantando com o convite do boto, Júlio César chamava ávido por ele: “Boto, tô aqui! Boto, tô aqui!”. A sonoridade desse chamado, que ecoava por todo o rio Madeira, produziu no artista a sensação de um chamado maior: boto, tô aqui… boto tô…. bototo…. botôto! Sentado em uma canoa, pensativo e encantado, Júlio César viu, maravilhado, um ser de luz tomar lugar na proa da canoa em que estava. A voz imperativa do ser superior lhe ordenara: “Tu não és mais Júlio César das Artes, serás agora Botôto!”. E assim o foi e tem sido.
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     Hoje, contando quatorze anos de vivência em Porto Velho, Botôto já é um artista da terra, apreciado e amado. Quando chegara à capital rondoniense, o artista logo notara a ausência de uma atmosfera artística plena, ou melhor, orgânica. A constituição e estabelecimento de Rondônia fazia, talvez, com que a arte aqui produzida fosse fragmentada ou fragmentária. Somado a isso, Botôto teve acesso a um discurso muito negativo acerca de Porto Velho, mais que isso, Botôto percebeu que o muito desse discurso era produzido na própria cidade, em um processo paranóico de autodepreciação.
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    Mas algo lhe incomodou nesse ponto: fora recebido tão bem nessa terra, com tanta solicitude e abertura que não entendia como poderia ser essa mesma terra um espaço que carregava tantos adjetivos depreciativos, como violenta. Pensando em um modo de apresentar ao Brasil e ao Estado uma perspectiva mais real de Porto Velho, e de Rondônia, - o que não significa uma perspectiva alienada ou acalentada - Botôto organizou sua primeira exposição, intitulada “1º Exposição Janela de Rondônia”. Nas obras que apresentou em tal exposição, Botôto fez uso de cores alegres e fortes para caracterizar o caloroso sabor rondoniense, expressando com elas sua incontida amabilidade pela cidade que lhe acolhera.
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   A técnica artística de Botôto é múltipla, assim como multifacetado é o artista. Botôto faz uso de todas as técnicas de pintura possíveis, não se filiando unilateralmente a nenhuma, mas servindo-se delas de acordo com as necessidades emotivas de sua inspiração momentânea. A arte se faz em seu processo, Botôto tem ciência disso. Ele é um terapeuta da arte: diagnosticando tristeza e angústia, subscreve cores fortes, tons de vermelho, amarelo e laranja. A arte cura, e nesse caso, a cura é dupla: é cura do artista, que precisa expressar sua dor/alegria através da arte; e cura do apreciador da arte, que precisa consumir aquela expressão de alegria/dor para sanar em seu ser a dor da titânica luta dos opostos.
      Amante da região amazônica, Botôto não esconde sua preocupação com o cuidado com a natureza, através de uma pedagogia ambiental que o artista deixa transparecer em suas obras, reciclando materiais e utilizando-os para chamar a atenção da população para a gravidade da cultura do descarte. Gênio artístico que é, utiliza-se da ironia, da metáfora, para metamorfosear esses descartes, transformando-os em obras de artes e/ou utensílios utilizados em suas inúmeras performances artísticas, mostrando ao público que uma educação da percepção pode transformar tampinhas de garrafas em um objeto simbólico e artístico com o qual o artista transmuta os olhares da platéia e transforma-lhes os valores.
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    Essa talvez seja uma contribuição tão grandiosa quanto a própria obra artística de Botôto: o fazer artístico é também um fazer existencial. Como sempre diz Botôto: “Viver em um mundo cor de cinza, uma cidade cinza, é muito ruim e triste”. A arte, com suas cores e formas, dá vida ao mundo. A arte de Botôto, com suas cores vivas e fortes, dá fôlego aos homens, para que estes possam, assim, sobreviver aos mundos monocromáticos que ameaçam transformar em cinza tudo aquilo que o criador desenhou em cores vibrantes e celestes.
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